quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Sid-Friaça (Pseudocanto III)

Sid-Friaça
sentado num canto do Madrugada
relata os lances que o fizeram
subir ao ascetismo.
Sid-Friaça
conta
sempre
com a sorte
pra pagar a conta.
No banco do boteco fétido
esconde e educa a prole
(a ser também asceta).
Por longos anos mourejou
na Índia, em Goa, em Moçambique,
levado pela esquadra do Restelo,
na empresa finda que o poeta canta
e que o Queirós queria reatada por Ramires.
Agora seu pendor heróico é morto
pelo excelso maquinário que o domina.
A fábrica.
A vida confinada
em meio ao torno e o ponto do relógio.

Sid-Friaça come
as moças mais insanas
de beleza e sina
oferecida aos gajos
que caminham retos
pela ponte de Bouvard
Moças gordas como pelicanos,

feias e disformes, com as banhas podres,
misto de deboche e maquilagem.
moças magras e miúdas,
pequenas e ossudas
como garças desesperadas,
gralhas presas atrás de grades.
Moças que debalde se oferecem
quando passo classe-média no Passeio.
Mas Sid não, que não é disso;
é forte e rijo
tomador do biotônico da vida
e da desesperança.
Sid ensina a todos que não há saida.
Que a moça oferta em frente à réplica
do pórtico do cemitério de Cães da cidade de Paris
é tão boa meretriz e faz gozar
como qualquer puta que há
no antro mais famoso e fino
de Campinas e Curitiba.

Sid-Friaça heróico
Sid-Friaça, ressurgido do Restelo
receita que somente presta a embriaguez noturna do bufão errante:

"A névoa não esconde todo o cinza da manhã
Seus olhos já revelam esta grave inquietação
Os ônibus lotados de fumaça e de cigarro
fedendo-lhe a miséria como lixo e como merda (...)"

Sid-Friaça
Vive
no Hades, com Elpenor.


Paulo Bearzoti, de Fator X (Cadernos Militantes nº 12, Curitiba, novembro de 2011)

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