segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

passionata

o amor foi feito para
a imperfeição, para o silêncio
entojado de som e fúria
e gentilezas.
o amor foi feito para errar,
dar com os burros n´água,
perder a paz
e odiar de um ódio patético
e gago.

o amor é assim: uma bomba
de delicadeza e desejo
que arrebenta nossas manias,
nossas veias mais grossas,
nossos relógios e bibelôs,
nossas fotografias antigas,
estudos, trabalho,
o passatempo mesquinho,
a conversa fiada e o futebol
(na hora do gol,
você pensa nela e olha além,
através do alambrado, buscando
a improbabilidade
do jasmim).

as vacas, em sua mansuetude,
não amam.
mas os homens...
“um grave acontecimento
na vida de um sujeito ordinário
naquela tarde como qualquer outra.”

o amor nos emburrece,
nos embrutece (cavalos doentes,
anjos idiotas),
como se não tivéssemos nunca
amado
e desamado, amado
e desamado.

o amor remoça
e envelhece dramaticamente.
a mulher pode dormir virgem
e acordar na menopausa.
o homem pode acordar
analfabeto e se deitar um poeta,
esbofeteado por asas.

no meio do sono,
eqüidistância perfeita
entre sonho e realidade,
o homem, a mulher
trazem abaixo
com uma serra de sândalo
a árvore genealógica.

e há quem defeque estrelas,
estupidificado de infinito.
e há quem não consiga,
um trapezista interior,
levantar o garfo até a boca
ou amarrar os cadarços.

quase tudo o que se viveu,
todas as lições e sobrevirtudes
esfarrapadas, como se amadurecer
fosse a antevéspera do podre
e da semente.

o amor não se cura.
fica incubado
esperando a primavera,
a próxima (sempre prima)
MENTIRA
ah como eu minto
pra você pra mim, meu amor!

o amor
o amor,
a desaprendizagem.

o amor
sem o qual a vida
seria uma verdade (como a morte).


Rodrigo Madeira

9 comentários:

Anônimo disse...

bem que a tarde pudesse ser azul,
mas há tantos desejos

giulianoquase.

Anônimo disse...

Gosto dos poemas

de madeira







nara

Lau Siqueira disse...

Eu sempre disse: de Madeira também se extrai bons poemas.
há braços!
Lau

Adriana Riess Karnal disse...

Há inverdades no amar?Ah, não...o amor não há de ser em vão...

Anônimo disse...

só um probleminha...

"sobrevirtudes"(junto) - véu religioso, de freiras.

o título mudou. "passionata".

abç,
madeira

cañete disse...

Amei, amemmos, amén!
rsrsrs

Anônimo disse...

Neste Madeira corre a seiva
do bom poema.
aroldo.camelo@gmail.com

Iriene Borges disse...

Bravo.

Vilma Bieniek Paessens e Abner Ludovick disse...

Medo, é o que tive ao ler seu poema "realista" sobre esse sentimento tão banalizado ......medo de voltar a amar... apesar do seu poema parecer dar conta apenas do universo "viril", e acho que até mesmo por isso, seu poema me fez ver o amor ao invés de sentir...gostei