terça-feira, 24 de março de 2009

uma estátua

così totalmente
disanimata
ungaretti

teus cabelos de pedra
tua roupa de pedra
tua pele de pedra
teus ossos de pedra

tua carne de pedra
teu sangue de pedra
teus seios de pedra

teu amor de pedra
teu deus de pedra

(de pedra
teus pulmões
que respiram)

2

invento as linhas
de teu semblante,
anja irrepleta,
escamas de pétalas,
com o que tenho
de pedra
em meus rins e
nos olhos.

excogito a gramática
de teu sexo
e a geometria
de teu sono
com o que tenho
de pedra
em meus dentes
e ombros.

esculturo a tensão
granítica
de teus braços,
que diriam o movimento
na imobilidade
do mármore,
com o que tenho
de pedra
em meus calcanhares.

3

a vida
(sem sentido?)
que se sente.

tua pele
faz torneios
de intestinos.

tu te urinas, anja,
e te afogas em rios
de um segundo.

filha maciça
da mão e do chão
(não a desmemória
de beatriz),

da gravidade,
da incoerência,

aprendendo o que é
a morte.

aprendendo, enfim,
na carne irritada

a álgebra do efêmero,

que nenhum anjo
há de viver mais
do que a borboleta.

Rodrigo Madeira

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