domingo, 27 de abril de 2008


O Lago e o Lagarto que Observa

Escorre tempo escasso,
eco falso
floreando sentidos,
ouvindo latidos
de amigos fiéis,
já esquecidos,
perdidos em
compromisso
das coisas insensatas,
alardeadas & disputadas, &
numa hora destas,
em que o tempo reflete,
o brilho de uma lanchonete,
no meio de um deserto rodoviário,
como aqueles que se vêem
num filme yankee sexagenário,
a bordo da Nau do Si Próprio,
retorcido,
como vidro exposto ao ácido corrosivo,
da não aceitação,
da forclusão
de todo sorriso,
feito para agradar
o ingrato narciso
saciado,
da água do
Lago.

Ricardo Pozzo

sábado, 26 de abril de 2008

sexta-feira, 25 de abril de 2008


Di Cavalcanti

Primeiro Plano

Neste contexto em que nos encontramos, - música suave, quem sabe piano? - teus olhares tocam os meus em plano oblíquo, confidentes do acaso, comparsas do tempo perdido, entretidos nas próprias imagens, em nossos olhares.
Vejo-me em ti e a ti em mim. Vejo-te, e assim mesmo vejo a mim. Vês?

Que a suave brisa e a fumaça dos fumantes nos chegue antes da hora marcada, de transcorrer a trilha cotidiana e mergulhar nas selvas de granito, perdidos, como filhos sem registro, numa descontinuidade de rítmos.

Ricardo Pozzo

Estilhaços

Fui ferida pelos estilhaços do seu ego ferido
pelo amargor das decepções
que te deixaram os contos de fada.

Recolha, por favor, os estilhaços
do meu sapatinho de cristal.
Eu quisera fazê-lo,
Mas ele furou-me os olhos dos sentimentos.
Muito antes do raiar do dia.

Por favor,
Devolva-me os pedaços
Do que me fazia viver
E dá-me um pouco mais
Deste veneno que me suga a vida.
Ela já não será a mesma
Sem a ilusão que me querias.

Edileidi Cañete

quarta-feira, 23 de abril de 2008


Um Esperançoso Vazio

A vida como o desespero das entranhas mucosas explodindo em pequenos espasmos. Todo o dia como o desespero dos telefonemas não atendidos, das mensagens descartadas, dos afazeres que a verdade dolorosa do pensamento não lhe deixa executar. Vazio.

Os remédios que tenho de tomar, o manequim com os cachecóis que ganhei de amigos distantes, as bolsas dependuradas à espera de uma mão que as leve para a rua... as roupas amassadas no cabideiro. As bolsas... esperando o vital momento de quando uma delas será enchida e enchida de esperança, dinheiro, cigarros e alguma maquiagem;

Vejo tudo no entardecer tristonho desse sábado, a cortina branca dum pano indiano caríssimo que agora não tem mais graça nenhuma, os móveis pretos e a minha máquina de escrever que não escreve sozinha, os livros que não se lêem apesar de eu já tê-los engolido inteiros. É o que dizem sobre maiores abandonados e a solidão que faz companhia, e a fumaça que gira, e a parede sangrenta logo atrás.

Beijos, corpos, amontoados, lençóis que eu estive todo o dia: a espera de um choro ou qualquer sorriso. O caco do meu telefone celular, a doença da tristeza de tê-lo quebrado sem querer, o soco no estômago logo que acordei e a felicidadezinha amena de uma mensagem de bom dia...

Rodopio dentro de mim mesma, penso estar na rua, caminhando e ouvindo música, indo para a praia, indo tomar sol e ler alguma coisa, encontrar qualquer alguém; não acredito mesmo que a vida possa ser tão frágil a ponto de só poder imaginar algum movimento, algum passo, algum acaso.

Acontece que todas as vezes é assim, tomo refrigerante, engulo comprimidos, boto pra dentro tragos de cigarro sem gosto, relembro as coisas da noite passada e imagino como será a de hoje; talvez eu não saia, talvez eu saia. E não saberei que bolsa levar, não saberei que sapato usar e muito menos que roupa jogar no corpo. Talvez eu jante, num lugar bonito e aconchegante, e mais talvez ainda a comida estará ruim: estremerecei-me.Poderia ir ao cinema, assistir ao filme sobre o Bob Dylan, que ainda não morreu, mas não gosto mais de ir ao cinema desacompanhada. Espero qualquer sinal enquanto o sono vem chegando porque o desespero é tanto e a saudade é demais.

Engulo meu castigo tedioso de nunca ter o que fazer. Não vou reler escritos velhos, muito menos tentar, com o coração aberto, ler o meu livro mal escrito. Não vou na impulsividade navegar na loucura destemida que me chama, porque sou mais, porque sou eu, eu é quem digo e agora estou em ordem. Ouço uma música tranqüilizante, violinos e piano e espio de dentro para fora de mim as fotografias; Diane Arbus, Freaks, Wiktin, Saudek e até mesmo as minhas. Galhos retorcidos, controvérsias, vergonhas...Insanidade controlada, um gole, um trago, uma luz.

Uma música que não toca: “Padam, Padam”.

Juliana Vallim

extraído, com permissão, do blog Fac-Símile: http://aospecadossilencio.blogspot.com/

Na Praia

Passeava sozinho pela praia, estava havia pouco de retorno à cidade natal! Uma linda cidade litorânea, já na meia idade trazia consigo lembranças de sua infância, onde seus castelos de areia eram sempre os mais altos, e as muralhas , as mais resistentes às carícias das ondinhas cansadas, mas insáciáveis, que chegavam ás areias. Da juventude, lembrava da moça mais bonita da praia, que com ele muito passeou de mãos dadas. Olhava os casais, indo e vindo lentamente, sem preguiça de serem felizes.A luz do dia já se esvaia , se perdia na água que se misturava ao céu, azuis de tinalidades diferentes sendo agraciados pelo laranjar do sol. a ternura vinha em brisas, desfazendo a vaidade dos penteados e refrescando a alma dos casais..."Que bela paisagem para ser emoldurado por olhos sensíveis, perfeita pra se ter ao lado e caminhar de mãos dadas com um verdadeiro amor ", pensava ele.A beleza do fim da tarde , lhe saudava, como lhe dando boas vindas.Percebeu vindo ao seu encontro uma bela jovem senhora, talvez a mais bonita daquelas areias, ela se aproximou, lhe sorriu , estendeu a mão e caminharam juntos, de mãos dadas , ao sentido oposto da solidão. E assim foram, marido e mulher, molhando os pés, para o primeiro passeio depois de muitos anos exilados da cidade natal.
Júlio Damásio. Do livro: "A Compota de Pimenta e outros contos puramente picantes. "
Praça Carlos Gomes

Papillon

Leva em tua alma
Meu pequeno poema.

Das essências que saem
de meu incenso, lágrimas
escorrem de minha face.

Ergo meus olhos ao infinito
e chego a delirar de tristeza.

Te roubaram o fôlego.
Me roubaram tua voz
Mas deixaram tua lembrança.

Deste poema tão extremo
Da pena que não sabe o que fazer.

Transcrevo minha dor dilacerante
Em nome dos olhos fechados.

Daniela Vieira



Catedral Metropolitana de Curitiba

Luiz

Quando soube da gravidez da esposa, o humilde homem iniciou os planos para o último dos dez rebentos: "vai sê dotô !". A mãe compartilhava o sonho do marido . Nenhum dos outros filhos põde estudar, herdaram do pai o trabalho na lavoura e como o pai , trabalhavam árdua e esmeradamente. Os outros nove filhos não sentiam inveja dos planos traçados para o caçula, que nem havia chegado ainda, pelo contrário, também queriam que a família tivesse alguém estudado, sentiriam orgulho em dizer: "dotô fulano de tal é meu irmão ! " . A mãe ,dona Candoca , imaginava como seria ter um filho que falava igual ao "dotô devogado " que passava na televisão. Via-se fazendo perguntas ao filho que ainda estava na barriga: "qui qué dizê essa palafra mio fio ?". Os planos foram se solidificando enquanto a barriga crescia. quando a criança nasceu o pai deu o nome de luiz (havia visto na televisão que era nome de alguém importante) .
Luiz cresceu como uma criança normal do interior. os pais não lhe exigiram que trabalhasse desde cedo, como haviam feito com seus irmãos, aliás como era costume naquele tempo na roça. sua única obrigação era o estudo; "já terminô a terefa fio ? " . Perguntava a mãe toda tarde . E também o pai quando chegava da lavoura. Até os irmãos eram cuidadosos com os estudos do mais novo ; "ocê vai sê diferente di nóis tudo, ocê vai sê dotô, intão istuda pra módi num caí nos cabo da inxada".
Quando Luiz terminou as séries fundamentais precisou estudar em uma escola de outra cidade, acordava bem cedo para aproveitar o ônibus que levava os bóias-frias e voltava a pé os sete quilômetros de estrada de chão que o distanciavam de sua casa, sofrimento maior era nos dias de chuva , chegava todo coberto de lama. Mas para alegria da família Luiz não desistiu. Quando entrou na Faculdade de Direito a situação ficou mais difícil ainda, o jovem precisou ir para uma cidade ainda mais distante e só voltava de quinze em quinze dias. A família fazia sacrifícios para manter o universiário estudando longe mais não importava; todos se sentiam felizes e orgulhosos por terem um membro da família estudando "pra sê dotô das lei". A mãe mal podia ver a hora de ouvir o filho falando difícil e todo certinho. Mas passou o primeiro ano e o rapaz continuava falando como antes, como sempre falou.
O curso já estava na metade e nenhuma mudança drástica , se não tivessem inteira confiança no caráter de Luiz, desconfiariam que não estivesse estudando, que estivesse se divertindo à custa do sofrimento da família. ninguém se atrevia a falar nada a ele, com medo de magoá-lo. Tentavam disfarçar a frustração de não verem nada de mudança no filho.
Na faculdade Luiz se destacou como um ótimo aluno, aplicado e sempre tirou boas notas. Nos trabalhos que tinha que apresentar demonstrava uma grande eloqüência e os colegas que o conheciam desde o início do curso espantavam-se com a evolução que teve com a língua culta; não falhava em nenhuma concordância, enriqueceu absurdamente o vocabulário, usava verbos bastante incomuns para enriquecer seus discursos de persuasão. conseguiu um bom estágio remunerado e com isso pôde dar um pouco de folga para a família, e essa nova fase matou qualquer desconfiança que pudesse haver, por menor que fosse com relação aos estudos do rapaz. Luiz já estava no último ano; decidiu fazer um esforço para agradecer aos paiz e irmãos que tanto o ajudaram em sua formação. Fretou uma perua e alugou alguns quartos em uma pousada para que a família estivesse presente em sua formatura.
Todos, sobretudo a mãe, já haviam se resignado com o fato do filho não mudar como eles queriam, e nunca comentaram, nem mesmo entre eles, suas frustrações, e cada um decidiu sózinho nunca comentar a decepção que tiveram com os estudos de luiz. Não queriam magoá-lo. A família do advogado se assustou, quando ouviu que o formando Luiz dos Santos faria a homenagem aos pais presentes, em sua simplicidade não queriam que o filho passasse vergonha, depois de tantos discursos bonitos e com palavras difíceis luiz seria motivo de piada com sua linguagem simples da roça. mas acabada a homenagem os irmãos o aplaudiram em pé, como todos na platéia; e um casal de velhinhos chorava abraçado perdido na multidão, depois de ouvirem o belíssimo discurso, que sabiam que era direcionado a eles, proferido pelo Doutor Luiz José dos Santos.

Gilson Pereira

Largo da Ordem

sexta-feira, 11 de abril de 2008

Dupla Forma

Não livres do tenebroso fantasma da inflação!...
Empresários barrigas verde, atuantes no setor funerário,
Propõe-se a implantar em Curitiba- o aluguel de caixão- ,
Para abaixar o inesperado e dispendioso custo com velório!

A dupla forma- urna alugada , mais requintada;
Abriga outra, mais simples, para a despedida sofrida...
Após a cerimônia para o enterro, a pessoa é despida.
Nesse dorido momento- a camisinha de madeira é retirada...
Restando a dúvida aos presentes: quantas vezes foi usada?

Ah!...Que grande constrangimento isso trará à família !
Protege o solo sagrado e as madeiras nobres, em extinção...
Porque então, não reduzir os custos para a cremação ?!

Estamos todos, sim !... frente a uma faca de dois gumes:
De um lado, o bom, reduzir altos custos, despesa porreta !
De outro, o ruim : transigir e renegar os bons costumes!!

Artur Barbosa

terça-feira, 1 de abril de 2008

Grupos Epopéia e Pó&Teias

Porão Loquax

Banquete de Palavras

No retorno do Porão Loquax, projeto de poesia e literatura do Wonka Bar, Surian Barone dirige a performance "Banquete de Poesias" com poetas dos Grupos Epopéia e Pó&Teias de Curitiba. Adriano Smaniotto, Carlos Souza, Walter Martins, Cristiano Faria e Ricardo Pozzo participam deste surreal convite à antropofagia literária. Com textos poderosos em uma concepção cenográfica surpreendente. Concepção e Direção: Surian Barone.

Wonka Bar, a partir das 23h
Rua Trajano Reis
R$1,99

que tremam os acomodados

O trema está trêmulo - dizem que este ano cai.
Querem apagá-lo do português - brasileiro, na forma que nos é peculiar.
Nosso trema é um tique, um truque, um toque feminino; duas pitadas de delicadeza para romper a rigidez da sílaba com a modulação sinuosa do "u".
Querem alcançar a padronização lingüística!
Esquecem que o caminho mais fácil nem sempre é o mais belo, mais útil, ou mais agradável.
Acham que o trema é uma das "chatices" da nossa língua - mas, nunca ouvi dizer que algo se tenha tornado mais monótono.
O trema são covinhas no sorriso do "u".
É ele que condimenta a lingüiça.
Torna mais repetitivas as intermitências de algo que é freqüente.
Denuncia a propriedade de movimento dos aqüíferos.
Põe gotas de suor ou lágrimas em algo que não mais se agüenta.
Empresta cor, cadência, malemolência, ginga - mesmo a palavras áridas ou graves como "argüição", "conseqüência", "ungüento", "iniqüidade".
É o brilho par da justiça em "eqüidade".
É o vento vibrando a superfície de um lago tranquüilo; tranqüilo e vivo.
Sem o trema ficaria prejudicada a eloqüência da brasilidade em nossos gestos.
Reservo-me o direito a meus tremas- e meu computador até completa as cumeeiras do "u" se por descuido os esqueço.
Eu sou a favor da simplicidade ! - mas por princípio, não por preguiça ; almoçaria sem toalha na mesa domingueira - mas não sem flores.
Em outras palavras ; há que simplificar - porém sem perder a "tremura " jamais!
Priscila Prado

Hoje o Blog Pó&Teias Completa um Ano

weeeeeeeeeeee!!!!!!!!!

temos 677 visualizações de perfil e
9126 visitas à página!!!!

parece mentira, mas não é!!!


grato a todos os visitantes e participantes!!!!!


Ópera de Arame
"Do not go gentle into that good
night,
Old age should burn and
rave at close of day;
Rage, rage
against the dying of the light."

Dylan Thomas

"Não te vás dócil boa noite
adentro,
Cabe à idade se irar e
arder no fim do dia;
Afronta, afronta
a luz que está morrendo. "

trad: Nelson Ascher


O ator Mihail na peça "O Pagador de Promessas" - Festival de Teatro de Curitiba - 2007