quarta-feira, 30 de janeiro de 2008


Poema XXI

Dê-me um beijo suave
Eis que o outono caminha a passos lentos
E eu, mergulhado em arrependimento
Por sentir o que, no momento,
É não adequado sentir

Acaricie meu rosto
E grave,
Com delicadeza
Toda a agressividade
Que se encontra
Na tristeza
Do mau perdedor

Livre é aquele que sabe perder.

Ricardo Pozzo

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Um dia eu me vou
E isso tudo se anula
Meu sentimento assaz complicado
É do tamanho que você procura

É feito sob medida
E ainda me tortura
Essa carne ferida Este sangue que
borbulha

E essa carência desmedida
Solitária qual a pomba que arrulha
De qualquer sensatez desprovida
Que à minha desdita se mistura

Devolva a minha vida
Devolva minha ventura
Essa aventura proibida
Que é causa de minha loucura
Já espôs esta vida malferida
Aos encantos da tua doçura.

Márcia Cruzara
( Boca do Inferno. CAL-UFPr.16ed.junho 2006)

Atletiba

Amava a rapariga.
Amor pra toda vida.
Podia ceder até aos incômodos pedidos de casamento...mas almoço de domingo na casa da sogra...
vá lá ... fora de cogitação.
Comando ou nome do arquivo inválido.
- Mas a gente se ama querido. Olha aqui a aliança não sai do meu dedo nem prá toma banho. Até tatuei tuas iniciais no gordinho da coxa...
- Eu te amo, amorzinho ,com todas os as redundâncias típicas dos apaixonados.
Não me entendas mal...mas almoço de domingo é sagrado : mamãe futebol clube!
É pior que jogo no caldeirão.
Amor desfeito sem direito a prorrogação ou disputa de pênaltis.
Caldeirão fora do fogo.
Falta de sensibilidade.
Isso que dá namorar coxa-branca.
Arisco, conto de Adriano Esturilho
(Quixote, julho 2005, literatura p. 17)

segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

sábado, 26 de janeiro de 2008

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Indecisão

Indecisão.
Em meio a turbulência,
meus olhos vislumbram
a inocência, e com tristeza,
esgueiram-se por entre
paredes escuras,
onde a pedra gelada
cala a agonia.

Poucas palavras diria,
se a noite rápida dormisse,
e eu pudesse estar
perto dos teus ouvidos.

Infelizmente,
a mente turva enobrece
a força bruta
em todas as decisões.

Ricardo Pozzo

Ricardo Pozzo e Carlos Sousa

Poema I

Incansável madrugada
Por onde meu ser penetra
E acomoda-se em contornos.

Ricardo Pozzo

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

"Quem não sabe povoar sua solidão
também não sabe estar só
no meio da ocupada multidão."

Charles Baudelaire

sábado, 19 de janeiro de 2008

Photo by Albert Nane

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

A Quadratura do Círculo

Estou cansado, estou tonto de tantas voltas. Alguém vai parar o movimento? O tempo? Devo permitir? Devo deixar que siga sem conhecer o caminho? Gostaria de ensinar o destino, pode-se ensinar o que ninguém conhece? Alguns querem um destino. Eu quero o giro, a volta, o retorno eterno que paralise os sentidos. Olham para mim, mas sei que não me vêem. Não se pode ver o que não pára. O movimento é invisível. Só a fé tem cor, mas o mundo vê em preto-e-branco e as luzes escurecem a única revelação possível. Querem passar. Não quero abrir caminhos, não conheço caminhos, passem por cima de mim! E me destruam!Para que eu possa me reconstruir e me reencontrar onde nínguém jamais me viu, jamais me vê. Serei invisível, seria ou sou. Quero o fim. Desta e de qualquer outra vida que me conduza ao caminho onde estou e nunca estive. Não inteiramente, integralmente ou verdadeiramente, inconstante, incontável em lugares onde procurei por você, estando eu e você e não encontrando a nós. Procuro e procurarei e mesmo assim estaremos assim a sós no mundo que criamos sem perceber, sem sentir e sem querer. Morreremos sós. Num círculo que só nos reconduziu ao mesmo lugar. Gostaria que a morte soasse como alívio nesta hora.
Cansei, cansei, cansei...vamos para casa...deixar que a vida siga seu caminho. Quero a casa , olhar o fogo da lareira e que nada, nem ninguém me atropele, quero seguir a vida, seja ela em círculos ou em retas, apenas em retas, somente em retas, retas em círculos...Mas em círculos, nada poderemos...mesmo nas bocas mais gostosas, ou até mesmo ao lado do dono de todas as bocas, nada seremos. Em círculos... eternos círculos...nada vamos conseguir...somos assim todos de ninguém...sempre vazios de bocas repletas de beijos de ninguém...
Gisele Mocci. Ângulo Bi. Parte IV. Final

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

A Quadratura do Círculo

Giro em torno de um grão de poeira, e é toda a poeira do mundo, poeira que fica em beira de estrada. Na estrada havia você me esperando. Estaticamente branca como uma nuvem de pó, envolta em tudo que não se pode tocar. E como num círculo, novamente perdido em todas as vastidões, te encontrei como uma velha conhecida, talvez um conhecido de ninguém, já que só você poderia conhecer quem eu não sou verdadeiramente. Busquei inúmeros aspectose em nenhum pude verdadeiramente reconhecer o que sou em tudo que não posso ser para você. Para você sou um nada abundante, um vasto círculo de nada. Talvez um nada semelhante a um oceano de ondas dúbias repletas de "eus" , do que não se pode entender. Você nunca me entenderia, já que sou o nada sempre te incomoda. Te ama e te incomoda. Sempre. Em todas as vezes sou absolutamente útil para você, na cama ou no trânsito, uma vida que não anda, apenas vaga em nossos devaneios. Devaneios em círculos múltiplos, que me sufocam e me fazem a cada momento ser duas vezes o homem que você nunca vai conhecer. Apenas eu e você em fugas filosóficas que não nos cabem . Mais uma vez não nos cabemos no mundo que nós próprios criamos. Por que criamos? Por que se preocupar? A vida segue seus círculos ininterrupta, despreocupada ou inconsequentemente, alheia a mim, a você, a nós, infinitamente, sendo ao mesmo tempo reta círcular que traça os caminhos que desconhecemos e ainda assim seguimos,
para onde? Pra que saber? Eu, você, nós aqui pra quê? Perguntas sem necessidade de respostas, policiadas ou não, vividas ou não. seguimos reta e despreocupadamente os círculos infindos que a nós foram expostos, impostos ou apenas apresentados, pra quê ? Estou aqui, estamos aqui, pronto. Calemo-nos e sigamos sem perguntas, respostas, indagações inúteis, vâs, que não nos levarão a canto nenhum. Calo-me em meu nome, em seu nome, em nosso nome e permaneço, permanecemos, vivemos e fomos circularmente aproximados por garras invisíveis que nos aproximam cada vez mais e por todas as direções possíveis e inimagináveis.
Gisele Mocci.Ângulo Bi. III Parte.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

A Quadratura do Círculo

Eu vim das loucuras puras, simplesmente loucuras. Loucuras de tudo o que não percebo nos círculos de pensamentos que nunca me levam a você. Te chamo, mas o som segue direções que nunca são as nossas. E você é curva como os lados da maçã. Curvas que minhas rodas não percorrem, porque fui sempre retas . Aprenderei um dia a curvar-me? Estou treinando. Circulo, circulo como aros de bicicletas e carros já buzinam passagem. Não parecem entender os mistérios do mundo. Não sabem que o mundo roda e tudo termina e começa num novo fim.
- Não quero terminar. Não podemos fazer de conta que nada mudou? Sermos amigos ...?
"A vida não volta, ela segue em frente. Não sou o que fui. "
"É só lembrar. Você já foi um dia. "
"Não existia você. "
O centro. Um centro e todo mundo correndo ao redor, como estrelas dispostas depois da grande explosão. Mas não se beijavam, brilhavam e viviam do próprio brilho. Passeavam como cometas, antes de encontrar um planeta onde ancorar. Atraídas pela beleza, não conseguiram mais enxergar-se e se atiraram no abismo. Destruíram vidas como quem ama demais, sem aprender o que é o amor.

Gisele Mocci.
Ângulo Bi. II Parte

Andarilha

O novo prédio reveste a carcaça do antigo casarão que fora armazém e residência há mais de cinqüenta anos. Manuela fita o passado olhando para o vazio da transparência da vitrine.
Vislumbra o balcão de madeira, encimado pela balança Filizolla, o fumo de corda e os gatos. Gatos de balcão. Imponentes, deixavam acariciar o dorso macio alongando-se ou pulando rápidamente se não gostavam do freguês.
A porta nos fundos da loja separava-a da residência que era fantástica.Um extenso corredor levava à sala e aos quartos. O alçapão revelava a escada que conduzia à cozinha no subsolo. Era algo mágico, diferente das demais casas conhecidas. Para a menina de então, descer por ali era uma aventura fascinante. Como aquela gente era rica!
No velório do avô a oportunidade de xeretar por toda parte foi perfeitamente camuflada pela condição de amiga da casa. Entrou aqui e ali, sem ser interrompida e vislumbrou cortinas, poltronas, camas, armários, tapetes tudo o que para ela, era sinônimo de abastança.
Visitava com o pai aos domingos o bar e sorveteria do Demétrio, no prédio ao lado. Embutidos no balcão, dois cilindros giravam produzindo a massa de textura macia e cheiro bom. Havia várias cores, de vários nomes, mas o sabor de todos era o mesmo.
O barulho do trânsito trouxe-a de volta.
Caminhou decidida com uma ponta de contentamento, pela calçada, por cima de suas pegadas de menina. Dobrou na esquina à esquerda. A pequena travessa, reformulada, é agora a avenida que liga os dois bairros.
Observou o prédio construído no terreno da casa da infância. Manuela visualizou o local exato do seu quarto de menina. Naquele espaço onde dormia e sonhava com quem iria ser quando crescesse.
Memória é pensamento e pensamento é cegueira porque não deixa ver as coisas como o são no momento presente.
Respirou fumdo e continuou sua caminhada com o sentimento de saudades de como as coisas eram, naquele passado que não existe mais.
Marilza Conceição

Samba


golfadas de fantasia despindo a lucidez...
escolas-de-samba percorrendo as minhas veias,
a chuva de prazer...

e a certeza de um céu constelado de bucetas.
mulatas rebolando úmidas em minhas línguas,
seios em sensual desespero escorrendo
em meu peito como morros e favelas.

piratas saqueando o ouro de minhas palavras
e as enterrando sem mapas
em algum canto de tantos carnavais.
sons e visões da negritude...

um pierrot decreta cambaleante
a eterna Quarta-feira de Cinzas...
e um ser...

um ser fantasiado de cachorro,
lambe a minha cara:
não foi cultura e nem raça,

foi coca-cola com cachaça.

Jorge Barbosa Filho

Le piéton de la grand´route

para rp.

Eremita das ruas noturnas e soturnas,
das madrugadas estilhaçadas
de alcatrão
com hálito de eterna solidão,
tingindo corpos devotados
à insatisfação
transeunte e assassina
de tudo
que cheira à loucura.

Deisi Perin


A professora e escritora Glória Kirinus, em palestra a respeito de Pablo Neruda.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

A Quadratura do Círculo

Círculos, círculos, círculos, círculos...intermináveis círculos ... tal qual meus minutos, minhas horas, meus dias, meus últimos 35 anos.
A estrada, a reta, leva a algum lugar? Aonde?
Se eu andar em círculos, a estrada volta? Vou retomá-la , poderei percorrê-la? Se eu viver em círculos, o mundo vai deixar de rodar, a vida seguirá seu trajeto? O círculo pode deter a estrada?
Vejo movimentos rápidos, de pessoas. Parecem ir. Qual a diferença entre o ir. Qual a diferença entre o ir e o vir? Qual é o sentido?
Algumas param, mas os círculos continuam. O homem não pode estacionar. Por que? Porquê? Por quê? Porque? Qual é a diferença que existe entre nós? Por que parar? Por que continuar? Qual é a verdade da reta? Tudo hoje está sem sentido. Tudo sempre está sem sentido! Ir?...
Ela ficou em casa. Rodando? Ela rodando naquela sala minúscula a perguntar, a experimentar entender, tentando encontrar respostas, por mais óbvias e vagas. Os pensamentos rodando, um sentimento reto, mas sem direção.
Alguém está querendo ir, deve ter aonde chegar. Se eu mudar minha vida, se mostrar os círculos, ela me verá, perceberá que o melhor é o retorno, para onde tudo conflui?
Me pergunto quando foi que comecei a girar. Será que foi naquele dia, quando percebi que os olhos dela giravam de mim para os outros,de mim para o copo de gim-tônica? Tudo é círcular, o amor não nasceu para seguir em frente, mas para retornar sobre si mesmo e recriar-se.
Estou agonizando, gostaria de seguir sem rumo, me entregar ao mundo, mas existe um obstáculo na frente e o único meio de evitá-lo é continuar em círculos, rodando, volvendo, tornando para o que fui...
Círculos, círculos são sempre o restante dos goles que não bebo em sua boca reta, repleta de instruções que não consigo digerir. Vejo você, e outra vez meus pensamentos circundam tudo o que não consigo explicar nessa pessoa que não há. Todos os círculos sempre convergem em você é o eixo que não existe e está sempre presente.
A vida me espera. Não sabe que não há espera no que circula, pois tudo volta e nada deixa de estar onde sempre esteve. Quer passar? O que espera encontrar além dos círculos de meus passos no asfalto? Gostaria de dizer para voce não continuar. Não há nada ali na frente. Tudo está aqui, neste momento, nestas voltas de nós sobre nós mesmos. Avançar? O mundo não avança, gira, e com mais velocidade do que um peregrino consegue acompanhar. Um carro não vai te levar mais longe.
Gisele Mocci.
Quadratura do círculo. parte I. Ângulo Bi.

Zona

A zona que encontro
É deveras perniciosa,
Espalhou-se pelo mundo
De maneira astuta e silenciosa.

Não se vende apenas corpos
como antes,
Mas drogas
Rins e córneas.

Não se tem sossego,
Nem sucesso.

Essa gente estranha e calma
Vai por fim
Leiloando a própria alma.

Deisi Perin

Espiral de Fumaça

Traços,
traçados sem nexo
(reflexos de meus espaços),
na intensidade de fumaça
que esvoeja no tempo
inexato de minha percepção.

Incito,
em brado mudo
(de onde nascem os sonhos,
florescem as fantasias!),
desaquietando espectros
passageiros de momentos
irreversíveis.

Por rebeldia,
em esboços abusados
extrapasso a inércia dos sentidos.
Esculpindo-me ao lume
de mim mesma.
Finalmente,
repouso na Poesia.

Andrea Motta

Imersão

Eu, jogando às traças meus pensamentos alheios, enxergo por entre a neblina densa que forma-se nos tensos cigarros que fumo. Nunca mais a voz sinistra pousará como abutre em meus ouvidos espantando os pássaros do equilíbrio. Integro imagens fúteis com idéias rebuscadas. Quebrado, quase frágil, descubro por instinto as prováveis saídas desta cela cerebral. Mensagens cifradas rasgam a pedra gelada e deformam paredes, tênue labirinto. Teias de transmissão; sinais detectam ausência lógica do néctar corrosivo que dissolve minha fuselagem. É o vento gélido que encobre meus passos entre as ruas laceradas desta  metrópole. Observo quieto, os fantoches e bonecas de pano, zumbis feitos de susto e confusão, que caminham trôpegos, que desfiam roucos, a cotidiana ladainha mecânica que gera  desperdício. Estátuas de zarcão trajam molambos, recobrem suas almas vazias. Não sorriem nem sonham, conformados pelo intenso espetáculo da frustração. Nesse novelo de circunstâncias imponderáveis, é o maceramento obtido através dos olhares do exílio, que torna intacta minha indignação.
É inevitável a escolta ao ultrapassar a região limítrofe entre a insanidade e a lucidez.

Ricardo Pozzo

terça-feira, 1 de janeiro de 2008

"Um livro deve ser o machado que rompe o mar gelado existente dentro de nós."

Franz Kafka
“Há trezentos anos, pelo menos, a ditadura da utilidade é unha e carne com o lucrocentrismo de toda essa nossa civilização. E o princípio da utilidade corrompe todos os setores da vida, nos fazendo crer que a própria vida tem que dar lucro. Vida é o dom dos deuses, para ser saboreada intensamente até que a bomba de nêutrons ou o vazamento da usina nuclear nos separe deste pedaço de carne pulsante, único bem de que temos certeza”

Paulo Leminski