sábado, 28 de abril de 2007

1964

Thank´s
nas ruas.

Ricardo Pozzo

sexta-feira, 27 de abril de 2007

Triste pra quem?

Bate sete da manhã,
Mas sete da manhã não bate.
O vizinho bate:
Pau na lata,
Aliacate no cano,
Martelo na cabeça do prego...
Antes na cabeça dele.
Tem telhado bonito,
Tem mandar elogio retroativo.
Tem grade branquinha,
Tem lei não tem bom senso.
Tem aposentadoria
Duma vida que ia
Longe da mulher das filhas.
Da responsabilidade do amor da dor.
A pena, desta vez útil,
Serve-me de calmante.
De tranquilizante,
Imaginar o fim:
Da reforma e da vida.


Rodrigo Ceccon

quarta-feira, 25 de abril de 2007

terça-feira, 24 de abril de 2007

Vibração

Eu sou de mim
Cada pedaço de desejo
De ser nada
Em sintonia absoluta
Com o espaço
No universo
O meu tempo
Meu pedaço
Canta à noite
E à lua cheia
Mãe brilhante
Minhas dores e temores
Mero andante
Andarilho das estrelas
Entrelaço
Laço a alma
Amo a vida
que me faço
e refaço
em saudades e amores
construção de sonhos
lapidando as dores
transformando em estilhaços
e nuances do saber
inteligência infinita
da essência do querer
Em Ser,me transformo
E ascendo o fogo da Evolução
É a chama do amor
Luz Perfeita
Refletida do vibrar do coração

Alessandro Jucá

Sonho

O espírito Blake pairou com olhos da noite prateada, acima de minha cabeça. Ao seu lado, um Rimbaud de cabelos enfurecidos, resmungava como menino, desvairado e sem ritmo.
- Vem! - ordenou Blake; a parede dissolveu-se à minha frente.
Tragado, como quem cai para o lado, senti um alívio suspeito que transcendia as batidas em meu peito. À minha frente, por um caminho que dividia o Jardim em duas enormidades, Blake andava altivo, olhos fixos. Carregando, com a esquerda, um livro de secretos antigo.
Eu, sem perceber onde, ia observando direções extremas. Faiscavam explosões laranja contra um céu violeta sem estrelas, na vasta planície de árvores arcaicas, a escura e ampla claridade dos trovões que traziam a chuva que não caia.
Rimbaud, cuspindo pelo chão, cantarolava uma canção ébria, fascinado pelas imagens aéreas das imensidões que se formavam. Ouviam-se sussurros de fadas & demônios erguidos pelas aves raras ao redor. Labaredas de fogo intermitentes. Sol e Lua frente a frente.
No equinócio de meus sentimentos, alheio aos desdobramentos do universo que nos cercava, caminhávamos à uma multidão. Havia um púlpito lacrimoso em pedra, à espera de um orador. E lá, todos os poetas malditos que sofreram em vida a vida de milhões. Os consagrados e os que nunca foram reconhecidos por ninguém.
Mirei-os. Em cada um havia estrelas apenas na noite dos olhos. Borges enxergara assim quando fora do espelho. Dos Anjos e Alves cantarolavam, incitando a multidão. Pégaso, o cavalo nascido do sangue vertido da Medusa, repousava soberbo entre as explosões dos céus violáceos. O fogo rubro guardado pelas sentinelas era saborosamente experenciado, ferindo a tenra Língua dos que ainda não tinham se acostumado com a Sabedoria ancestral dos Eóns humanos.
E vislumbrando o que seria o Inferno, ou o Céu dos Poetas, despertei.

Ricardo Pozzo

segunda-feira, 23 de abril de 2007

Último Branco

Paro para o céu,
Um fim de tarde que arde o incerto.
Estou certo de nada saber,
De nada sentir,
De nada ser.
Nem poeta até o próximo amanhecer
E, esquecer do último verso.
Inverso a tudo onde estou
Nada me sobra: papel, palavras, o Sol.
O último branco da nuvem
A última idéia que me contêm.
Ser tudo de novo
E nada também.

Rodrigo Ceccon
Poetrix

Eu - Com a paciência esgotada
Cansado dos contos de fada
Que a tua embriaguez me contou

Ricardo Pozzo

domingo, 22 de abril de 2007

nu fechando a porta

teu corpo nu
sob a torneira
de tanto orvalho
teu corpo nu

é todo feito
de abertos lábios
navegadura
em manhã clara

traduz o sol
para o alfabeto
das coisas líquidas

o mar vai sempre
arrebentar
em tuas costas

Rodrigo Madeira
(Espaço tempo dos pulmões que se respiram)


Chamava-se um, logo após, dois e depois enumerou, com exatidão e totalidade, zero. Esta história poderia muito bem começar descrevendo o aspecto físico de uma menina cuja verdade fora roubada. Mas não. Não vou explicar as incertezas do que enxerga-se sem perceber ser mentira.
Então começo categoricamente com o meu zero já habituado. Zero porque dois corpos já se anularam e se tornaram um. Perdendo a materialidade, perdendo os genes, veias, ossos; perdendo tudo. Chegando ao marco zero de todo o espanto de vida vivida. Esta é uma história verdadeira. Sim, completamente verdadeira esta que tento escrever agora. Deixo bem claro que ela faz parte do meu diário pessoal, que este texto está situado nas minhas páginas descoladas e que em alguns minutos a tinta falha. Espera e expansão.

Tudo começou errado, como era pra ser errado, desde que o rumo desregulado começou a criar fatos. Era pra ser, era pra desaparecer no meio dos outros. Mas uma menina entrou no meio dos fios, dos teares e dos completos emaranhados. Extenso - tenho certeza que isso será doloroso - no quintal das almas, no topo dos arranha-céus; uma rede e a ponte bamba. O que me toma é a certeza de que há na vida coisas inexplicáveis. Fatores de importância dois*, passando para o um* e tornando, sem perceber, zero*. Raros chegaram - como eu - no marco zero de todas as sensações. Chegarão no novo princípio retilíneo da perfeição semiprimitiva?
Os outros nunca entenderão. Nunca chegarão no espaço-tempo que anula os corpos, memórias e conceitos. Não sei se serão de fato, mutilados pela diferença, se perceberão que a exatidão lhes falta, assim como a perfeição. Serão sim, esmagados pela gargalhada das quatro paredes à vertigem de uma transição que não se vê. E no entanto, existe ainda a quinta proporção. Quinta relação entre seres. Essa ainda é capaz de anular o zero*. Só que aí nada mais tem volta. É de uma sensibilidade terrível chegar na quinta capacidade de usufruir entonações da alma. A história que eu ia descrever já se perdeu da realidade e escapou da minha memória. Vejo as imagens turvas e já não posso descrever fato por fato; instante por instante que se mata, que se perde. E a degola na síntese dos mistérios que existem entre tudo o que circula. Entre tudo o que direciona e dobra para a direita.

Não saber e não saber que não se sabe. Saber e saber que se sabe. Para mim, essa é a diferença nada sutil entre os seres. Digo que as demonstrações humanas que geram algo "sentido", meramente sentido, são um simples engano. É um simples motivo para que a sua internação seja providenciada o mais rápido possível. A internação do seu corpo e o embalsamento de sua mente. As outras percepções, que vagam pelos sentidos, são as que realmente existem. O que não é eterno; o que é puramente liberto. O ato verdadeiro não é baixo como suas atitudes, nem sincero como as suas mentiras. O ato de poder desenhar-se entre páginas de papel de arroz e pássaros intactos é equivalente ao marco zero*: marca-se. Saber os fios que são seus, as cores que pertencem ao seu corpo, a categoria das explicações, o valor das palavras, saber que tudo isso é inexistente. Mas vamos ao fundo de toda essa loucura limítrofe, olhares que se escapam, fumaças que dançam, pessoas que se perdem, passos que retroagem. Andando nessa direção pontilhada da imensidão de duas mentes no marco zero*, digo com clareza o que penso: tomaria de você as fitas que saem do estômago, engoliria o teu mundo só pra que ele não te fizesse sofrer. Mostraria minhas realidades, suas mentiras que não são mentiras, mostrar-lhe-ia tudo sobre todo mundo e sobre tudo no mundo.

Um poste. Uma cadeira. Nossas línguas esquisitas. Nossas bocas saindo palavras, nossa linguagem inventada e uma verdade. A verdade é que a história da menina se perdeu e essas outras linhas se encontram nas páginas brancas escritas com tinta invisível. Acordes de música, partituras soltas e o que não se sabe. Eu não quero mais explicar para a outra lá, que se perdeu achando que a vida é eterna. Desejo-te. Destruo. Invento-te os mundos. As roupas se rasgam, os outros partem, porém as ligações frágeis de uma linha, de um tempo, de um interstício - ah Deus, devo dizer isso?
- essas ficam...

Mme. Valentina
Ácido

O ácido corrosivo das palavras
Atinge certeiro
As profundezas do coração.

O que É
Se disfarça prá não Ser.

Estropiada e Só,
Procuro chão sob meus pés.

Joselaine Mota

sábado, 21 de abril de 2007

O adormecido da esquina

Foi encontrado numa esquina
Em posição de ter sono agitado
Fome e frio não lhe despertam
Não tem em si mísera coberta
Foi encontrado numa esquina
Investimentos detrás os dentes
Fosse a sorte teria outra sina
Foi encontrado numa esquina
Com o peito inteiro crivado.

Ricardo Pozzo

Grisálida

Ela, sonâmbula ingênua,
alimentando-se dos resíduos de pão
recolhidos à tarde,
(são seus passos grisálida emplumada
em desalinho com o vento),
digere antídotos contra o próprio veneno.

Depois de enxugar lágrimas de acetona,
de dissecar a fauna de seus sentidos,
de esmorecer em falsos desatinos,
de esquecer seus primários instintos,

Depois de estar no purgatório
por não se enxergar Beatriz,
de reverter o espólio
em simples cicatriz,
escalavra em suplício
interstícios do equilíbrio.

Não seus cabelos entretidos
por entre os dedos em busca
de sensíveis vestígios sensoriais
(qual a seiva das horas
que expandem sombras espirais).

Nem seus ombros
de fascínios destacados
em gargalhadas leves
(que denunciam o alto
risco de surtos breves),

Mas o simples olhar
inveterado
ao reflexo do espelho
inviolável
de seus pensamentos
espectrais.


Ricardo Pozzo

A escritora Glória Kirinus e sua biblioteca.
rivotorto
a ricardo pozzo

tua loucura
é calculada
como
um poste
de luz.
teus coturnos
de não pisar
os mortos.
sobre
os ombros
agüentas
uma igreja
– devotada
a tudo
(e a tudo)
o que está
fora dela:
a catequese
da carne,
a língua álacre,
o ázimo
de estilhaços.
e na assinatura
das madrugadas,
sabes que
a mão
do assassino
é a mão
do pedinte.
caminhas
delicada-
mente
o eremitério
das ruas:
o corpo
da amante,
os cacos
de garrafas,
o gesto
do derrotado.
tingidos do lado
da flor,
os ossos
de cera de vela,
teu hábito
de alcatrão.

tua alma,
amigo,
é uma bandeira
despregada

Rodrigo Madeira

quinta-feira, 19 de abril de 2007

Templo da Raça da Fé

Volto das águas inundo ao redor
Bebo cidades, idades, desejos e vou
Sou o tempo que queima
Planetas têmporas e
Danço no temporal
No raio parto à galope
Cidades respiram
H2O, papelotes, gasolina
Chove sal e enxofre
E absorvo
Novo ente
Novo horizonte que retornamos
Sobrevoando montanhas
Nas correntes vamos
Do selvagem ao indigente
Não só praias separam
O país mais catatônico
Cata o tônico
E toma catatau
Tiram os clientes de Cristo
E da praça do Templo tupiniquim
Do Templo da Raça da Fé.

Carlos Sousa

quarta-feira, 18 de abril de 2007

Tingui

Em meados de agosto
Frutos amargos produz
A cerejeira que transpira
Em chamas.

Ricardo Pozzo

terça-feira, 17 de abril de 2007

Um

Sobreviventes sub-envolventes
Do cataclisma fugaz
Formatados de morte
Em meio à pandemia
Carnívora e voraz.

Qual bálsamo desejado
Subjacentes epígrafes
Marcam respostas ingênuas
Embalsamadas com sândalo.
Hologramas decifrados da busca
Contrária à reverência divina.

Inconstante e indigna
Sagrada na individualidade.

Angela Gomes e Ricardo Pozzo
Pai Compartilhado

Pai nosso alcoolizado,
Embalado em sacolas plásticas
De mercado.
Excremento social,
Degredo dos Deuses.
Semblante maior que a velocidade das galáxias.
Austeros dias perseguindo o fim
De uma vida tão desejada.


Angela Gomes

domingo, 15 de abril de 2007

sábado, 14 de abril de 2007

A Poética do Espaço

Os escritores Wilson Nogueira, Rory Cardoso, Deisi Giacomazzi e Julio Almada

sexta-feira, 13 de abril de 2007

Incensório

Armaduras de alumínio, fumegantes
Revelam que a fumaça era, desde antes
A estrutura de que são formadas
A essência das figuras humanas aladas

Quando o brilho atinge seu ponto mais intenso
E ressurge o ódio, que mantêm o olhar suspenso
Fornecido ao Fiel, o imaculado alívio químico
Trava guerra contra o pútrido pelotão maligno

Cruzando horizontes intrapsíquicos
Deglutindo amargos pesadelos
Evaporam venenos específicos
Nas bordas da existência está o Tempo.

Ricardo Pozzo
Gangue do Bolo


É sombrio, amarelo, quente e frio
Beber da tempestade
No romper da aurora...
Num Leandro aos gritos de revolta
Em cima das mesas ou escalando muros;
Jogando-se em fontes a cata de um sonho.
Valsando com o corpo em dores,
Movimentos felinos
Na esquina do bar.
As horas absorvem o sono e,
O dia troca de lugar com a noite
Nos degraus da escada voante
De um Carlos Mandrião,
Tecelão de borboletas.
Asas de luzes sustentam a fraternidade:
Poenteiantes, GK, Propriamentedita, Poetas Vivos.
Andarilhos das letras em CWB.
Profundo e difuso Pozzo
Escrevendo nas vias, Lenda Urbana.
Urbanóides vociferando mijos de tinta
Da Madeira mais Nobre.
Estefano Curitioca lapidando
O tempo das palavras dodecassilábicas...
Mari, Angela, Deise, Glória,
Maradigmáticas musas...
Poemas e poetas ocultas.
Almada, alma alada,
Flambada em vinho andino.
W Nogueira bebendo das fontes
Com os cavalos e a lua cheia.
Das rotas bocas umedecidas
Brotam as manifestações mais fortes.
Correnteza sanguínea violácea,
Ultravioleta.
Não importa a cor da tinta da caneta,
Tempestade de gente
Tem sangue vermelho.


Angela Gomes

terça-feira, 10 de abril de 2007

Crisálida

farei de cristal e som
uma barreira
de mental e sono
de magia e sonho
de metal e pedra
de vôo e queda
do que se pega e sente
uma barragem
de conter o tempo.

forjei abismos onde abriga-se o passado
moldei montanhas
das marcas no solo
pelas solas dos pés.

a brisa cicatriza a sombra
que a luz desenha.

Carlos Sousa
Indecisão
Indecisão. Em meio à turbulência,
meus olhos cativos vislumbram a
inocência perdida e, com tristeza,
esgueiram-se por entre paredes
escuras onde a pedra gelada cala
a agonia. Poucas palavras diria
se a noite rápida dormisse, e eu
pudesse estar próximo aos teus
ouvidos. Infelizmente, a mente
turva enobrece a força bruta em
todas as decisões. Melhor dormir

e sonhar.
Ricardo Pozzo

domingo, 8 de abril de 2007

Vermelho escorre escuro
Entre pedras podres de sal
Quatro foram os estampidos
Ouvidos pela lateral

A moça crispada estendia
Trinta curiosos aos seus pés
Boca aberta, olho cerrado
Intenso
É o sabor enferrujado
Que fogo nenhum inverteu

A legítima indefesa
Iluminada por sirenes acesas
Sem o auxílio de Deus.

Ricardo Pozzo
canção d’aluada
para m.

podou-lhe a perna um acidente...
se em torno a malta ri, indecente,
quando escorre, lesma esquecida,
de par em par em par doente,
– ignora todo o malquerente,
fecha as pálpebras dos ouvidos.

o sangue ou o bosque de abetos
realçam pungentes insetos
que dançam nos globos dos olhos...
e na pelanca encanecida
queixam-se seus anos de vida
feito um bater d´água em abrolhos.

deus está-lhe sempre tão perto...
e se anoitece e chove fetos,
como se fora o último amigo
(e ele soubera dos ocasos
a urgência rubra dos cavalos),
ela lhe faz um só pedido:

"dai-me um desses, pai, pr´eu velar,
berçar ao vento, acalentar!
súbito me farei lactante,
de um leite azul e muito grosso;
em meu seio como num poço,
receberá beijos na fronte!"

deus, para ela, não é silêncio:
abelhas com patas de incenso,
ou as gaivotas de lençol...
a tinta verde dos fadários
na carne viva dos diários
ao sabor ferroso do haldol.

e à vida sentida sem margens,
deriva, stultífera navis,
arrebenta a quilha da testa;
degradando-se em tons de maio,
céu e mar se beijam no raio,
– e a barca vai a pique, em festa.

no idioma dos fogos sujos,
líquen da voz de caramujos,
língua de carvão, frágua e ferro,
fala com dentes, pêlos, unhas,
com a morte por testemunha:
há mil gritos em cada berro.

claudica com severo olhar...
se alguém lhe oferece um manjar
– entre anjo, mendiga e sibila,
camélia, garçonete e gueixa –,
mordiscando a carne da ameixa,
preclara, antevê grande dia;

se lhe negam, porém, já viu:
nos cílios acende o pavio;
na pança encruada dos sapos,
transtorna pra fora do leito
a manta de banha e despeito,
e desdobra a língua entre cactos:

"hei, bruxarada, bruxarada,
quando faz rir a madrugada,
envido de cima do outeiro:
vou defecar em seus sapatos,
envenenar seus cães e gatos,
vou tacar fogo em seus cabelos!"

porém a ira logo termina,
ela é novamente a menina;
retira do caule um jasmim,
florescido entre as muitas farpas
do arame e a galharia e as sarças,
– o vôo ambíguo do rubim.

pequena, frágil, recolhida,
bem quando mais lhe dói a vida,
claustra o brilho opaco dum monge.
respira, parte a flor, se indaga
(o corpo nu no chão – jogada):
"como vim acabar tão longe?"

sonha a antiga vida das ruas.
vive, de resto, abandonada:
sem homem, sem filho; só a lua
que a leve de volta pra casa


Rodrigo Madeira

sábado, 7 de abril de 2007

Gangue do Bolo

É sombrio, amarelo, quente e frio
Beber da tempestade
No romper da aurora...
Num Leandro aos gritos de revolta
Em cima das mesas ou escalando muros;
Jogando-se em fontes a cata de um sonho.
Valsando com o corpo em dores,
Movimentos felinos
Na esquina do bar.
As horas absorvem o sono e,
O dia troca de lugar com a noite
Nos degraus da escada voante
De um Carlos Mandrião,
Tecelão de borboletas.
Asas de luzes sustentam a fraternidade:
Poenteiantes, GK, Propriamentedita, Poetas Vivos.
Andarilhos das letras em CWB.
Profundo e difuso Pozzo
Escrevendo nas vias, Lenda Urbana.
Urbanóides vociferando mijos de tinta
Da Madeira mais Nobre.
Estefano Curitioca lapidando
O tempo das palavras dodecassilábicas...
Mari, Angela, Deise, Glória,
Maradigmáticas musas,
Poemas e poetas ocultas.
W Nogueira bebendo das fontes
Com os cavalos e a lua cheia.
Das rotas bocas umedecidas
Brotam as manifestações mais fortes.
Correnteza sanguínea violácea,
Ultravioleta.
Não importa a cor da tinta da caneta,
Tempestade de gente
Tem sangue vermelho.
cabeça de fauno

às vezes é como se tudo
se despedisse de mim.

marcelo mastroiani
(em "Ginger e Fred", de Fellini)

em meio aos dias insones e lentos,
quando, noturnas, crocitam as gralhas
e o relógio (de peito) que escangalha
acende os mil lampiões mar adentro;
em meio aos dias insones e lentos,
quando os céus pasmam, azuis e lilases
e as árvores debandam com as aves
e meus mortos acenam com seus lenços,
lembrar pretendo quem fui noutras carnes,
qual foi o derradeiro pensamento,
quando de mim rescaldou em meus lares;
quais bichos, homens, selvas, avatares

em meu próprio sobrenome, madeira
entalhada à lâmina da fogueira

Rodrigo Madeira
Insano

O Deus da Guerra está enfermo
Massacrado pelo medo.
Geme à ferida da fúria
Escarlate e insegura.
Cospe lágrimas, incandescentes
Sobre escárnios e escombros...
Movimenta-se lento
Na atmosfera rarefeita
Mutilada e imperfeita.
Arrasta-se, arrasta-se...
Ante um tempo sem dobras,
Um tempo linear
De alvéolos sonolentos
Sôfregos pela fumaça.
Arrasta-se, arrasta-se...
Mas insiste em respirar.

Angela Gomes

Frente Fria

Chegou uma frente fria
No sul do país
Com previsão de geada,
Branca como o giz.
Ai! Isto aqui está parecendo o Alaska.
Estou me sentindo,
Um sorvete na casca.


Cida Magalhães
Flerte

Através do Desejo
Meu Olhar
Se fez Beijo

Ricardo Pozzo

quinta-feira, 5 de abril de 2007

O Insone

People are strange
When you´re stranger
Faces look ugly
When you´re alone.
Jim Morrison


Enquanto os bons dormem
a Lua é alta
E eu vagando por ruas escuras
Onde a madrugada nua
mostra-se sedenta

O Tempo fluindo como a Maré Cheia
Tragando os passos que ficam para trás
Encontro-me perdido e embriagado
Numa multidão de desconhecidos

Enquanto os bons dormem
a Lua é alta
E eu vagando por ruas estreitas
Onde a madrugada nua
mostra-se sinistra
E os lobos à minha espreita
Farejam a minha pista

Enquanto os bons dormem
a Lua é alta.

Ricardo Pozzo
fortim

eram tantas veredas e pomares,
que não sentia da fruta a toxina,
à descoberta de outros paladares
quando febril, dentava a mancenilha

Eram lúridos, previstos azares,
eram dédalos em lugar de dedos;
vela de sete dias, sete mares:
- preparar horizontes de degredo!

lá, destalado entre o sol e a ardentia,
quem quer tentasse não me alcançaria...
o futuro ia erguer gradil estável

ali, onde morrem aves regressas...
hoje não! sou fortim inexpugnável,
porque minhas portas estão abertas.

Rodrigo Madeira

de seu livro: Sol sem Pálpebras
Cavalgo o Dragão
Por sobre o Abismo
Entre brumas do Tempo
Que refletem Luas Cheias

E, em Silêncio Cósmico,
Poemas ancestrais Ecoam
Como, em Voz Suave,
Mil Sereias.

Ricardo Pozzo

terça-feira, 3 de abril de 2007

Sexta Feira Santa da Paixão

Acomodo lentamente
espinhos
nas bordas do
meu prato

de longe
A samaritana
aprova este banquete
num cálice
de compaixão

Dois cedros
em cruz

acompanham meu silêncio

e o rosto
esquivo
de cristo

parece que sangra
menos

Gloria Kirinus
balada da cruz machado
tem piedade, satã, desta longa miséria!
charles baudelaire


uma rua à queima-roupa
curta, brilhante, sem fôlego
(puta nova mas ancestral)
rua-faca, rua-vício
a cruz machado termina
nos pés de uma catedral.
alguém além de deus e
da polícia e taxistas
e putas e vigaristas
cafetões e travestis
sabe que depois das 20
nas calçadas do acinte
beijam latas os guris?
que se agridem por farelos?
que se juram por centavos?
filhos do sangue e do escarro
talhando derrota para o horror
de bicho caçado
que, de manhã, tresnoitara...
para as gargantas gastarem
para os alvéolos gritarem
nesta imunda forja da
convulsão respiratória
este pão da falta de ar
na mesma lama ofertória
a ninguém ou coisa alguma
que a raiva de mendigar
que a fissura que verruma:
pedra pedra pedra pedra
quem dentre vós estiver
sem pecado
que fume a primeira pedra.
e as putas e travestis
não se prestam a outro talho
juntam seus pobres dinheiros
entre um cu e dois caralhos
e como sob a extensão
de um cargueiro embaraçado
prendem a respiração
pra sentir melhor o trago
pra soltar as almas junto:
pedra pedra pedra pedra
quem dentre vós estiver
sem pecado
que fume a primeira pedra.
em seu lado esquerdo a rua
rebrilha em néon e espelhos
ali se guarda a fortuna
de entrecoxas e de seios:
entre flores volitantes
homens ébrios dão risada
e depois como se dantes
sozinhos voltam embora
tristes, pisando nas asas.
fora do agito das boates
polícia é sempre polícia
grita, bate, extorque, ofende
e se, após, solta sorrindo
é por que já mordeu rente.
daqui a trinta minutos
numa curva mais rasante
arma em punho e voz rascante
revistam mais um otário
um pedreiro miserável
que voltava de assaltar
o som novo dalgum carro:
pedra pedra pedra pedra
quem dentre vós estiver
sem pecado
que fume a primeira pedra.
sob as marquises da rua
ou em ruelas bem próximas
que por vazias e umbrosas
são melhor acoitamento
e, em especial, no centro
pela praça tiradentes
(desaguadouro e monturo)
de homens sem qualquer futuro
traficantes e usuários
usuários traficantes
consumindo criptonita
qual se todas suas vidas
consistissem num segundo...
uma rua à queima-roupa
curta, brilhante, sem fôlego
de uma miséria ancestral
rua-vício, rua-oxímoro
a cruz machado termina
nos pés de uma catedral.

Rodrigo Madeira
Piás mal-educados
Mal pagos, distraídos
Motorizados
Cheirados a pó lvora
E chumbo
Não reconhecem, atrás de um cachimbinho
Um irmãozinho?
BANG !!!

Carlos Souza

segunda-feira, 2 de abril de 2007

Invenção

Parece-me que fui lançada pra fora da realidade. Para o mundo das inexatidões e verdades que se escalpelam. Vou mar adentro no caminho do amor; enquanto ele se resguarda. Estou triste agora por quê não sei e não sei como saber. Minhas perguntas flutuam em obscuridades doídas que acenam à minha dor de estar-se deixando viver. Não, eu não sei se seria capaz de amar e não sei mais. Não sei sequer se o amor existe: ah, esta conjuntura que definiram para que eu definhe... estou só, eu e o amor. Eu e o horror de não conhecer o invisível que me circula e o indócil que é toda a minha obsessão.
E então o que se resguarda sou eu. Eu, que tenho o medo menor do que meus sonhos, afasto-me dessa disfunção quase pragmática e choro. Não sei por quê, choro. E não sei por quê, penso em amor neste instante. Sou concisa quando olho o teu sangue já seco e lembro-me do resto. - E só amanhã saberemos.
Este amanhã me chegou rápido e chegou só a mim e ao sol. Fechei a cortina de meu quarto e pensei o que é que queria dizer aquilo, de só saber depois... não, eu gosto de saber no instante, gosto de sentir a clarividência tomando conta de cada pequenino gesto e de cada pedaço do pensamento. Esperei o amor e ele não me foi dado. Não; eu não sei o que é o amor. Sei que me agarrei como uma criança de colo ao corpo da mãe e não quis mais soltar; procurava algo suave com as mãos e não encontrava. E eu era a própria carne repleta de feição.
E me tornava cada vez menor. Tornara-me cada vez mais carne, como se estivessem unindo o meu minúsculo corpo junto àquele, que transpirava repulsa. Mas e a repulsa? Era toda minha?
Ainda não sei o que há de tão repugnante em um instante que faz desfazer todos os outros - dentro de mim – e desmorona-se tudo, como uma fileira gigantesca de peças de dominó. Estou eu, a errada, a que cai; e todas as outras, caindo... então eu sou a esmagada. E a minha chama morre; eu estou só e quero lhe dizer o quanto me sinto triste, o quanto de vergonha ainda cabe em mim. Mas não lhe diria. Não, eu não direi. Olho a sua imagem de ausência imóvel dentro de mim; sinto um buraco, algo negro se dissipando e estremeço. Não sei se talvez eu devesse chorar, talvez, o meu dever para comigo mesma seja este, chorar-me. Ou beijar-lhe e me calar? Exclamo mil vezes por segundo e não reclamo da sua inexatidão.
Desenvolvo isto após perceber que eu não estava e nunca estarei. Enquanto você estiver. Por mais que eu queira muito, e por tudo, eu nunca estarei. Enxergo agora de outro jeito, fecho um olho e apenas observo com o outro. Sinto-me assim, não sei explicar por quê eu própria não sinto isto que sinto; apenas agreguei ao meu pensamento-amor esta certeza, faço assim. Mas ainda, se eu me esforçasse, eu saberia explicar como é que se sente quando se encarna e a loucura se torna só um pedágio.
Em minha cama não há alguém. Deito-me só e sei que estou em silêncio. Pulsa o meu coração porque do outro lado pulsa alguém que não sou eu. Calei-me há milhares de anos, e estou assim ao perceber com verossímil atroz que vago além. Mas a minha alma, contudo, não viveu. Descanso e espero pelo amanhã e eu não saberei. Há um corpo ausente e seminu, este, do peito que encosto minha cabeça para dormir e a dor da limitação, o ardor de tudo o que transmuta sem mim.

Mme. Valentina
escritora convidada do Grupo Pó&Teias

domingo, 1 de abril de 2007

Projéteis paralelos mirados em alvos móveis
esfacelam mais um acéfalo cérebro periférico
vértebras vertidas no registro do plantão médico
criam e pagam salários aos assassinos
sub-produto social arremedos de gente ou
fardados preocupam-se
reagem feericamente
ao resultado do clássico
e choram lágrimas de cruzes
enquanto gente nem cru come
agentes da mudança pedem
em protesto e passeata
a troca do presidente
estadunidense mediante
aparecimento midiático
a apresentadora do telejornal garantiu:
- a vítima tinha medo
de sair nas ruas
durante os tiroteios.

Carlos Souza
Lua Clara

Dizias que talvez
seja sangue o que queiram
Serão gotas espirradas
o que vejo agora?
Já que lanças a lâmina
em tuas veias mais letais,
qual prazer sentes
ao livrar-te tantas vezes
daquela menina
que te olha do espelho
e que nem mais
sorry?

Em minha garganta
cravas tuas garras
Mas em teu jogo de espelhos
é outra que cala o grito surdo
com risadas.

Lança a Lua imensa
a clara estrada
e nem é em teus lençóis
que gemes;

Resta a madrugada...

Ricardo Pozzo
Arei, sulquei
Cavei, adubei.

A semente era eu
plantada no tempo

Cortei as raízes.
Nasceram asas.

Mas ainda
não aprendi a voar.

Deisi Perin
Labirinto

Quarenta e seis olhos sob a lanterna,
Vinte e três pessoas contemplando a noite eterna...
Prisioneiros de seu medo, ajoelhados na capela,
Velando mortos-vivos, seus próprios corpos.
Sombrios ventos, tempestivas vozes,
Pensamentos velozes, intragável tempo.
Ritmo de assombro no compasso dos passos
Entre labirintos esparsos de horas vazias...
Sob o signo dos que choram sem esperanças pela aurora,
Suas sombras são espectros das cicatrizes do dia.

Angela Gomes