Ele tem carteira de identidade
como tantos
ele tem CPF
com muitos números
possui carteira profissional
e muitas profissões
endereço fixo
de papelão
filhos com certidão
e uma companheira
para a vida inteira.
na linguagem dos governos
é um cidadão.
Fernando chegou chorando
olhos verdes congestionados
magro, barba por fazer
pedindo trabalho para viver.
Trazia a angústia da fome
dos filhos
que deixará sem comer
falava da falta de leite
falava de não roubar
o que lhe tinham roubado
desculpava-se por ter chorado
queria limpar banheiro
dizia: qualquer coisa posso fazer
minha sogra me chamou
mas nem ela tinha o que comer.
Fome de trabalho
de respeito
de direitos
Dor de abandono
de vergonha
de incompreensão.
Agonia, angústia e ira
remoem seu peito
em conflito chora.
o choro do
desencanto.
Não percebe Fernando
o peso das correntes
do sistema de opressão
que lhe nega o trabalho
quer lhe tira o leite
que lhe rouba o pão.
No rolar da lágrima
o grito da poesia:
"Prendam o ladrões da cidadania!!!"
Cidade, cimento, falta de emprego
que sofrimento.
Como dói estar só na grande cidade.
NÃO!!! Não quero roubar.
Só peço um pouco de leite
para meus filhos alimentar.
Roubaram-me tudo, menos
a dignidade.
Ainda restam-me lágrimas
e muita sinceridade.
Aqueles que não me compreendem
Que nem o tentem.
"Só compreende a dor da fome, quem a sente"
João Bello
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