quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

ao meu assassino

há muito equívoco nesta
cidade
sobre a morte de paulo leminski.
morreu de bebida, de curitiba,
de harakiri e o diabo.

deixe-me dizer-lhe
leminski está morto e fui eu
que o matei.
era tardinha, sete de junho
de 89, na esquina do stuart.
eu tinha apenas dez anos de idade.

abracei-o no golpe da faca
e só largaria
depois que ele se largasse. olhou-me,
exepcionalmente, com olhos de
cachorro manso e disse: "quem é vivo
sempre desaparece."
sorriu-me como se eu morresse.
por quê sabia que aquilo
era obra de um tigre...
hoje entendo a razão
de não ter cabido um "sinto muito,
poeta!"
é a ordem natural das coisas.
leminski também matou seu touro
e voltou para casa de mãos novas.

comigo
acontecerá o mesmo.
não fiz nem 28 anos e já espero
o golpe do meu vingador.
tenho esta impressão
de que ele virá da direita,
sabendo que sou canhoto em tudo.

morro de medo do menino que
fala sozinho, possível poeta,
da menina que penteia os cabelos
no vento (será poeta?),
de adolescente no expresso
que lê a ilíada em pé.
morro de medo, morro de medo,
mas não há jeito, é certo como o sábado.

na esquina de casa,
na saída do barbeiro,
na volta da banca,
na fila do banco,
num estacionamento
de supermercado, ele estará
a minha espera.
inevitável que seja.
em algum lugar da cidade
meu assassino esta nascendo.

escute daqui a alguns anos estas palavras:
"tudo bem,
cara, eu entendo! perdoe-se como eu me perdoei,
ou não escreverá sequer um verso.

apenas interceda em meu favor para que eu seja
enterrado em meu bar preferido.
só isso. os poetas merecem ser emparedados
em seu boteco eletivo, assim como as aves
devem ser sepultadas no ar.

o botiquineiro saberá rezar a minha missa."

não há jeito
é certo como o sábado:
tal qual as putas de outros tempos,
o poeta cora seu rosto com sangue.

o sangue de outros poetas.

Rodrigo Madeira

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