É com a despedida do sol que os ratos jorram dos bueiros desesperadamente. Não podem mais queimar as patas com o concreto quente, não podem mais ficar cegos com a luz insuportável. Surgem exemplares de várias castas – há os ratos filhos de outros ratos, que apesar da linhagem pura, são os mais sujos, e os bastardos, que podem ser filhos de leões ou cavalos de carga, mas não se intimidam com o ambiente não familiar e vão compartilhar com os outros a dor que é não se encaixar muito bem onde nasceu.
Não há mais aquele holofote gigante para apontar qualquer movimento deselegante. Não há mais as senhoras e famílias com crianças e pessoas decentes lançando seus olhares inquisidores sobre todos os sem padrões. E mesmo que haja, os ratos são mais numerosos. São maiores. A pequena sombra concedid...a miseravelmente pelo sol cresce e toma todas as ruas.
Então o mundo é deles. O opressor agora – Ah, doce vingança! – são eles: os ratos. Bêbados, chapados, trincados, espumando de loucura. Todos em sua própria sintonia, diferentemente dos leões e cavalos. Todos fazendo transparecer seu interior, ao invés de escondê-lo atrás de uma boa aparência, morais e discursos preconceituosos. Esfregam merecidamente sua individualidade na cara da parcela disposta ao lado direito da balança social.
Entram e saem de suas tocas sujas, reviram o lixo, brigam entre si, bebem, fumam, cheiram, trepam, comem qualquer porcaria barata – alguns devoram as baratas propriamente ditas – que conseguem comprar com suas poucas moedas ou acham por aí esquecida no canto de algum poste de luz.
Então a manhã ofusca sua visão, o chão começa a ficar morno, o ar torna a se mostrar cada vez mais careta. É hora de voltar para os esgotos e esperar que a noite chegue mais uma vez. Serão reis novamente.
Matheus A. Quinnan
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