domingo, 20 de fevereiro de 2011

Sílfide

Serpente venenosa, a fumaça do cigarro ia subindo. As imagens das  antigas namoradas vinham como a fumaça, em névoa fantasmagórica. Agora sozinho, sem ninguém... Só agora, de velho, percebe que seu jeito rude e grosseiro afastou todas as pessoas que o amavam e as poucas que ele realmente amou.

Sua visão também estava ficando turva, os olhos vermelhos - apesar de fumar há anos eles sempre se irritavam com a fumaça - e seu olhar brumoso vislumbra na fumaça um rosto. Encafifado, força a visão e começa a delinear um rosto feminino...

Sim...a fumaça do cigarro está delineando um rosto feminino... Perfeito, olhos, nariz, boca... Pensa em chamar a empregada para também ver isso, mas a fumaça é muito etérea e qualquer movimento mínimo já desfaz por milésimos de segundos o rosto perfeito... Ele se força a ficar com a mão parada, imóvel. Quase sem respirar, pois também a respiração atrapalha a figura feminina

Ela parece estar abrindo a boca para falar...

Mas o cigarro está no fim e ele se esforça para ouvir o que ela fala... Antes que se apague...

O que ela diz?

Sílfide?

Só fode?

Só pode! Só pode estar dizendo isso, que eu sempre me fodo!

E a imagem desvanece-se por completo, apenas fica no ar uma risada... Ele fica em dúvida se ouviu esse riso daquela boca sensual que lhe dizia algo...


Susan Blum

3 comentários:

Anônimo disse...

extraído do livro "novelos nada exemplares", de susan blum

editado pela amplexo, londrina, 2010

prefácio de paulo venturelli

pág 103

Anônimo disse...

Bom livro. Parabéns Susan!
Deisi

Susan Blum disse...

Obrigada, Deisi.