quarta-feira, 11 de setembro de 2019


O amor é um erro
um ancoradouro
com nossos pés
amarrados à costa
e nossa cabeça
fincada ao oceano.
O amor respira
nas plataformas
de petróleo
e queima
em sua extração
a certeza
de seu desgaste.
Vendido a granel
turbulento
em guerras
diplomáticas
despedaçamentos
vários.
Moro numa casa
que não há
engolida pelo fogo
não há terras
devolutas.
Após o fogo
nem tudo é trégua
- no amor -
há de ser justa
a propagação
do abandono.


Roberta Tostes Daniel


Indiferentemente




Além do rio existe,
Além de mim persiste,
Além.

Ali ao lado resvala,
Ali ao alto se cala,
Ali embaixo, sei lá...

Aonde eu vou?
Aonde é o rumo?

Leve a lauda louva,
E leda comunicação.

Aos ouvidos em turbilhão,
Sequer uma graça atingirá
A putrefação.

A estrada do teu ego
Anda em círculos.

Tchau.

Anderson Carlos Maciel


Não vai sobrar nada




Pedra sobre pedra
homem sobre a lajota dos pés
corpo moldando laje
de sol a sol
nuvem - chumbo.

Pedraria de tiros
silhueta calcinada
no cimento - sangue
esparramado, esquecido.

Meu Deus, mais um homem
virando nada, memória
luz estourada
andor da fé que se extirpa

a gente ora por desperdício
a gente chora só o fluido.


Roberta Tostes Daniel



FLORES VOTIVAS




Eu
não tenho
medo da morte.
Eu tenho medo quando uma coisa cai
e quebra
como porcelana,

seja uma velha amizade,
um novo amor
ou o sentido – fortuito – dos orbes.

Aí vem o vazio,
pior que a morte,
que não cola mais os cacos espalhados no chão.

Eu
não tenho
medo da morte.
Eu tenho medo da ode
inconclusa, da carta interrompida,
do beijo suspenso,
seja este poema – que em si nunca estará completo –
seja a vida, esta obra sempre aberta...

Por que o medo então,
se tudo é acidental
e acidentado? Por que não assumir de vez
que este medo – que me paralisa no trabalho, na fila do banco, no amor –
não é, no fundo, no fundo, o medo da própria morte?

Talvez seja
para não dar o braço a torcer
a esta velha desmancha-prazeres
que corta os brotos
antes das flores, ou, quando não,
colhe as flores antes dos frutos
– e as oferece ao Nada.

Otto Leopoldo Winck